SLB 2017

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sábado, 10 de setembro de 2011

Hoje encontrei o teu cão.

Hoje encontrei o teu cão.

Não,
ele não foi adotado por ninguém. Aqui, a maioria das pessoas já têm
vários cães; e aqueles que não têm nenhum, simplesmente não querem um
cão. Eu sei que esperavas que ele encontrasse um bom lar quando o
deixaste aqui, mas ele não encontrou. Quando o vi pela primeira vez, ele
estava bem longe da casa mais próxima e estava sozinho, com sede, magro
e coxeava por causa de um ferimento na pata.

Eu
queria tanto ser tu naquele momento em que parei em frente a dele. Para
ver a sua cauda a abanar e os seus olhos a brilhar ao pular nos teus
braços, pois ele sabia que o irias encontrar, sabia que não te
esquecerias dele. Para ver o perdão nos seus olhos pelo sofrimento e
pela dor pelos quais ele havia passado na sua jornada sem fim à sua
procura... Mas eu não era tu. E, apesar das minhas tentativas para o
convencer a aproximar-se, os seus olhos viam um estranho. Ele não
confiava em mim e por isso não se aproximava.

Em vez disso, virou
as costas e seguiu o seu caminho, pois tinha a certeza que esse caminho
o levaria a ti. Ele não entende que tu não estas à procura dele. Ele só
sabe que tu não estas lá, sabe apenas que precisa de te encontrar. Isso
é mais importante do que a comida, a água ou o estranho que lhe pode
dar todas essas coisas. Percebi que seria inútil tentar persuadi-lo ou
segui-lo. Eu nem o seu nome sei. Fui para casa, enchi um balde de água e
uma vasilha de comida e voltei ao lugar onde o tinha encontrado. Não
havia sinal dele, mas deixei a água e a comida debaixo da árvore onde
ele tinha buscado abrigo do sol e um pouco de descanso.

Vê bem,
ele não é um cão selvagem. Ao domesticá-lo, tiraste-lhe o instinto de
sobrevivência nas ruas. Ele só sabe que precisa de caminhar o dia todo.
Ele não sabe que o sol e o calor podem custar-lhe a vida. Ele só sabe
que precisa de te encontrar.

Aguardei na esperança de que ele
voltasse para buscar abrigo sob a mesma árvore, na esperança de que a
água e a comida que tinha trazido fizessem com que ele confiasse em mim e
eu pudesse levá-lo para casa, e tratar da sua pata ferida, dar-lhe um
canto fresco para se deitar e ajudá-lo a entender que tu já não fazias
parte da sua vida. Ele não voltou naquela manhã e, quando a noite caiu, a
água e a comida permaneciam intactas.

Fiquei preocupada. Tu
deves saber que poucas seriam as pessoas que tentariam ajudar o teu cão.
Algumas enxotá-lo-iam, outras chamariam o pessoal do canil que lhe
daria o destino do qual tu achaste que o estavas a salvar - depois de
dias de sofrimento sem água ou comida. Voltei ao local antes do
anoitecer. Não o encontrei.

Na manhã seguinte voltei, e vi que a
água e a comida permaneciam intactas. Ah, se tu estivesses aqui para
chamar o seu nome! A tua voz é tão familiar para ele. Sem muita
esperança, comecei a andar na direcção que ele tinha tomado ontem. Ele
estava tão desesperado para te encontrar que seria capaz de caminhar
muitos quilómetros em menos de um dia.

Algumas horas mais tarde, a
uma boa distância do local onde eu o tinha visto pela primeira vez,
finalmente encontrei o teu cão. A sede não o atormentava mais, a sua
fome tinha desaparecido e as suas dores haviam passado. O ferimento da
pata já não o incomodava mais. Agora o teu cão estava finalmente livre
de todo esse sofrimento.

O teu cão morreu.
Ajoelhei-me ao
lado dele e amaldiçoei-te por não estares aqui ontem para que eu pudesse
ver o brilho, por um instante sequer, naqueles olhos vazios.

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